Fórum debate progresso da técnica que permite atender pacientes on-line

De um lado da tela está o cirurgião Milton Steinman, coordenador de Telemedicina do Hospital Albert Einstein, em São Paulo. Do outro, médicos e enfermeiros de centros médicos espalhados por todo o país, em busca de especialistas que podem auxiliar no atendimento a pacientes. Steinman testemunha o crescimento desse serviço há quatro anos e amanhã participa do debate sobre consultas virtuais na primeira edição do Fórum de Telemedicina, promovido pelo Conselho Federal de Medicina (CFM).

Um diagnóstico da nova técnica foi traçado na edição da semana passada da “New England Journal of Medicine” Os pesquisadores americanos Ray Dorsey, da Universidade de Rochester, em Nova York; e Eric Topol, do Instituto Scripps, na Califórnia, avaliam que o crescimento da prestação virtual de cuidados aliviará as preocupações com a distribuição de médicos em um território e oferecerá mais flexibilidade aos profissionais e seus pacientes. Ao contrário do Brasil, onde o diálogo na tela é restrito à troca de idéias entre profissionais de saúde, nos Estados Unidos os pacientes já podem ser atendidos à distância.

ACESSIBILIDADE E MONITORAMENTO

Dorsey aponta três tendências que estão redefinindo a telemedicina. A primeira é o potencial desta técnica para tornar os cuidados mais acessíveis, o que poderia reduzir o seu custo. A segunda é a possibilidade de monitoramento a portadores de doenças agudas. Por último, a expectativa de que este serviço migre de hospitais e clínicas para a casa e os celulares de pacientes. Com as consultas virtuais, o médico poderia atender mais pacientes e reduzir o preço da consulta.

– Devemos expandir a medicina até que chegue à casa das pessoas – defende o pesquisador. – Mas alguns problemas ainda devem ser debatidos. Registramos mais doenças crônicas justamente no público que têm menor acesso à internet: idosos, pobres e moradores da zona rural.

De acordo com Steinman, que estuda o progresso da telemedicina nos Estados Unidos, mais de 15 milhões de consultas virtuais são realizadas por ano naquele país, onde o serviço já é aplicado em 32 estados. Os médicos são cadastrados e o seguro de saúde do paciente é responsável por pagar o atendimento.

– É uma técnica que estreita a relação entre médico e o paciente, que terá mais acesso a dados da sua doença e, assim, vai se engajar mais no tratamento – avalia. – O Google possibilitou a democratização da informação, mesmo que ela nem sempre esteja correta. As pessoas já chegam ao consultório tendo alguma noção de seus problemas. A telemedicina é uma nova forma de interação, que pega carona nesta conectividade.

O cardiologista André Volschan, coordenador científico do Hospital Pró-Cardíaco, acompanhou à distância mil exames realizados em cinco centros de saúde fluminenses nos últimos três anos. Em 308 casos, a equipe recebeu pedido de assistência remota devido à ocorrência de acidente vascular cerebral.

– A janela de tempo é muito pequena e, nos locais onde não há neurologistas, dizemos aos médicos que estão ao lado do paciente como devem proceder – conta. – Damos orientações depois de nos mostrarem imagens de ressonância e tomografia. Os exames físicos também são acompanhados por telas de alta resolução. Tudo é acompanhado ao vivo. É diferente de pedir uma segunda opinião.

Para Angélica Bõsiger, cardiologista do Hospital Federal dos Servidores do Estado, a principal utilidade da telemedicina é trocar impressões sobre cirurgias com seus colegas.

– Médicos de 83 instituições do país são convidados a assistir conectados a uma operação. Basta ter um login. Às vezes, debatemos como foi o procedimento – explica. – Acredito que a telemedicina beneficiará principalmente as especialidades cirúrgicas e intervencionistas, como ortopedia, neurorradiologia e cardiologia.

Coordenador da Câmara Técnica de Informática em Saúde do CFM, Aldemir Humberto Soares adianta que, no fórum de amanhã, o Conselho de Medicina abordará a evolução de softwares interativos que podem ser usados em consultas, assunto revisado pela última vez em uma regulação de 2002.

PREOCUPAÇÃO COM SEGURANÇA

Soares ressalta que uma série de condições devem ser analisadas antes da adoção de novas mídias na medicina.

– A confidencialidade é uma grande preocupação: precisamos ter certeza de que não haverá vazamento de informações trocadas entre médico e paciente. É necessário ter segurança contra hackers e alertar os profissionais para que não sejam descuidados – pondera Soares, que também é primeiro-secretário da Associação Médica Brasileira. – A ética profissional não deve ser ignorada. O médico não deve se esconder atrás da máquina. Ele continua responsável por seus atos.

A relação entre tempo de consulta e preço aventada por Dorsey também deve ser descartada.

– Para examinar uma pessoa, o médico pode precisar de uma hora; em outro caso, 15 minutos já são suficientes – descreve. – Não se deve baixar o preço para que o profissional receba mais pacientes. Há sempre fatores que interferem na velocidade do trabalho. Por exemplo, o envelhecimento da população está provocando o surgimento de novas doenças. Precisamos de tempo para analisá-las.

Os médicos são unânimes ao afirmar que as consultas virtuais podem complementar as visitas pessoais, mas jamais vão substituí-las. De acordo com Soares e Volschan, a presença do paciente no consultório reforça a intimidade e facilita a identificação de uma enfermidade, inclusive de sintomas que não foram motivo do agendamento da consulta.

– O médico ainda precisará de informações do histórico do paciente e analisar seu corpo – avisa Soares. – Mesmo com a nova tecnologia, um médico local deve acompanhar a evolução do tratamento. Em algumas áreas do país pode ser difícil encontrar um profissional que realize este monitoramento. Então, é possível que o regulamento da telemedicina não avance da mesma maneira em todas as regiões.

– Existem sutilezas típicas do contato presencial, levando a relação entre médico e paciente a um nível que não seria alcançado por um meio eletrônico – argumenta Volschan. – O exame físico nos permite analisar emoções que podem contribuir para realizar o diagnóstico.

“O Google possibilitou a democratização da informação, nem sempre correta. As pessoas já chegam ao consultório tendo alguma noção de seus problemas”

Milton Steinman

Cirurgião e coordenador de Telemedicina do Hospital Albert Einstein

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