Associação Americana do Coração recomenda atenção à pressão alta para preservar cognição
Pesquisa com 2,8 mil pacientes com mais de 50 anos investiga se redução da pressão arterial teria efeito nas funções cerebrais
Uma mente sã em um corpo saudável. A antiga citação latina acaba de ganhar mais um reforço de peso. Em declaração publicada ontem em nome da Associação Americana do Coração (AHA, na sigla em inglês), um painel de especialistas recomendou o controle da pressão alta, em especial a partir da meia-idade, para ajudar a proteger a cognição. A pedido da AHA, o grupo de médicos revisou a literatura científica disponível em busca de evidências que ligassem a saúde cardíaca à mental, encontrando diversas indicações de que a hipertensão influencia no desenvolvimento de doenças como o mal de Alzheimer, derrames e incapacitação cognitiva vascular, uma ampla gama de condições desde moderadas até mais severas.
Segundo os especialistas, embora os muitos estudos revisados não tenham investigado diretamente a ligação entre pressão sanguínea e cognição — o que impossibilitou que elaborassem um protocolo que guiasse profissionais de saúde sobre como tratar pacientes com hipertensão e algum tipo de demência — foram achadas várias instâncias em que a hipertensão pode ter colaborado para o desenvolvimento de problemas de memória, falhas nas funções executivas e redução na velocidade de processamento. Por exemplo, a pressão alta alteraria a configuração das artérias e arteríolas que alimentam as regiões subcorticais do cérebro, levando ao desenvolvimento da chamada “doença dos pequenos vasos,” que é a maior causa de derrames hemisféricos e danos à substância branca no órgão. Além disso, a perda dos microvasos detonada tanto pela hipertensão quanto pelo envelhecimento reduziria progressivamente o fluxo de sangue para o cérebro, prejudicando seu funcionamento e ajudando a promover a morte neuronal.
— Muitos estudos observacionais sugerem que o tratamento da hipertensão pode diminuir o impacto cognitivo da pressão alta, especialmente no que diz respeito à incapacitação cognitiva vascular, mas estudos observacionais não são desenhados para provar a relação de causa e efeito — ressalta Costantino Iadecola, professor de neurologia, diretor do Instituto de Pesquisas do Cérebro e da Mente da Faculdade Médica Weill Cornell e líder do painel, cujas conclusões foram publicadas no periódico “Hypertension”, editado pela própria AHA. — Sabemos que tratar a pressão alta reduz os riscos de doenças cardíacas, como ataques do coração, insuficiência congestiva cardíaca e derrame, e é importante que ela continue a ser tratada para reduzir os riscos dessas doenças. Mas também precisamos de estudos controlados randomizados, que provam causa e efeito, para determinar se o tratamento da pressão alta, especialmente a partir da meia idade, também vai reduzir o risco de incapacitação cognitiva mais à frente na vida.
Outra dificuldade enfrentada pelo painel foi o longo período que costuma separar a época em que o paciente começa a ter hipertensão da que passa a apresentar sintomas cognitivos que levam ao diagnóstico clínico de demência. Assim, também seriam necessários estudos de longo prazo para abordar questões como quando iniciar o tratamento da pressão alta de forma a proteger o cérebro, que nível de pressão seria o ideal e que remédios seriam os mais indicados. Iadecola, porém, destacou pelo menos uma grande pesquisa neste sentido atualmente em curso. Chamado SPRINT-MIND, subgrupo de ensaio clínico iniciado em 2010 com 2,8 mil pacientes com mais de 50 anos investiga se um tratamento intensivo para reduzir a pressão a níveis ainda menores que os atualmente recomendados também teria algum efeito na preservação das funções cognitivas.
– O SPRINT-MIND talvez nos dê respostas para algumas das questões em aberto da relação entre o tratamento da pressão alta e a redução nos riscos de alguma incapacitação cognitiva — conclui Iadecola.