CFM defende mudança em comissão da Câmara que prepara alterações de regras da saúde privada

O Conselho Federal de Medicina (CFM) defende que consulta médica seja retirada dos planos e paga pelo paciente, que poderá ser ressarcido ou não pelo convênio, de acordo com o contrato. “Isso desoneraria o sistema e seria fato de inibição de uso”, defende o conselheiro da entidade Salomão Rodrigues Filho. A ideia dele, apresentada na semana passada em audiência pública na Comissão Especial sobre Planos de Saúde, na Câmara dos Deputados, é que a medida não valha para as consultas de emergência.

Ele ressalta que o conselho estuda continuamente as questões assistenciais tanto no sistema público quanto no suplementar (privado) de saúde. “No contrato entre as operadoras e o beneficiário, poderá prever ou não a cobertura das consultas médicas, com limite anual negociado”, diz. Ele explica que o paciente escolhe o médico e faz o pagamento ao profissional na hora do atendimento e, com o recibo, pode ser ressarcido se o plano dele contemplar as consultas eletivas. Para ele, a medida tem impacto positivo ao reduzir os custos.

Na audiência na comissão da Câmara, o representante do CFM disse que algumas operadoras já têm feito isso, e a redução de gastos é significativa, sem prejuízo do atendimento de emergência. A comissão analisa o Projeto de Lei (PL) 7419/2006 e mais 140 propostas anexadas, que alteram a Lei dos Planos de Saúde – 9.656/1998. O relator da comissão é o deputado Rogério Marinho (PSDB-BN), que também foi relator da reforma trabalhista.

Advogada do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ana Carolina Navarrete observa que já existem hoje planos com segmentação hospitalar. “São aqueles que cobrem urgência, emergência, cirúrgicos, que envolvem internação. Já existem planos que não incluem consultas e exames”, diz. Esse tipo de plano representa por volta de 1,19% do mercado.

Para ela, se a mudança sugerida pelo CFM for para todos os planos existentes, será uma alteração drástica, que afetará 89% do mercado, além de interferir na oferta de produtos mais completos. “O impacto disso é tremendo”, alerta.

Segundo dados da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), o preço médio de um consulta paga pelas operadoras de plano de saúde ao médico é de R$ 80. O valor varia de acordo com o tipo de especialidade. Em Belo Horizonte, segundo dados de mercado, o preço médio de uma consulta particular varia de R$ 180 a R$ 350, valores que podem ser maiores dependendo da reputação do médico.

Já nas clínicas populares, uma consulta chega a custar menos de R$ 100. De acordo com a Abramge, os custos maiores das operadoras são provenientes de procedimentos de alta complexidade, como cirurgias, exames e internações. A entidade disse que não iria comentar a proposta do CFM.

IMPACTO NA PREVENÇÃO DE DOENÇAS

Eliminar as consultas eletivas de todos os planos de saúde iria impactar negativamente a prevenção de doenças e aumentar a quantidade de pacientes que buscam atendimento de emergência e urgência, observa o advogado Mário de Souza Aguirre, especialista em direito da saúde.

Para ele, o atendimento pré-hospitalar, que inclui as consultas médicas, deve ser privilegiado. “A identificação precoce da doença, por muitas vezes, evita que o paciente vá para o hospital, gere mais despesas, aliviando assim o fluxo de pessoas nos atendimentos de urgência e emergência”, analisa.

PROFISSIONAL DO PAÍS PEDE MAIS EXAMES

Os médicos de planos de saúde do país pedem mais exames de tomografia e ressonância do que profissionais de países desenvolvidos, segundo a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Em países como Alemanha, França e Estados Unidos, a média anual de ressonâncias é de 52 por mil habitantes. No Brasil, o índice foi de 149 por mil em 2016. O número de ressonâncias feitas por convênios passou de 5,7 milhões em 2014 para 7 milhões em 2016, alta de 22%.

OPINIÃO

“Só tenho plano por causa da empresa. É mais caro se não for corporativo. Se os consumidores tiverem que pagar a consulta, vai ficar ainda mais difícil para a maioria” Geizimara Araújo – Caixa

“Os planos populares podem ser uma opção para quem não consegue pagar o plano. Pode não resolver o problema, mas antes eles do que nada” Cléa de Jesus Lopes – Aposentada

“Eu pago plano e estou insatisfeita. Não acho certo a pessoa pagar pelo plano e ter que pagar pelas consultas. Assim, as pessoas gastam duas vezes” Renata Machado – Gerente

POPULARES ESTÃO NA MIRA DE ENTIDADES

A proposta de planos de saúde acessíveis, mais conhecidos como ‘populares’, apresentada pelo Ministério da Saúde à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), é condenada pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec). Para a entidade, a iniciativa em discussão não tem condições de oferecer serviços de qualidade e que deem segurança ao consumidor, podendo causar graves prejuízos, inclusive fazendo “explodir” a judicialização da saúde suplementar, ou seja, a quantidade de ações judiciais contra as operadoras.

O instituto considera os planos populares produtos-placebo – simulações de plano de saúde, não sustentáveis para o consumidor, que, se implementados, implicarão e mudanças radicais, para pior, na atual legislação sobre o tema.

Para o governo, os planos populares seriam uma alternativa aos cerca de 2 milhões de pessoas que perderam os planos ao ficarem sem emprego nos últimos anos. A caixa Geizimara Araújo Oliveira é uma das 47,6 milhões de usuários dos planos de saúde no país. Para ela, um plano popular não resolve o problema do acesso à saúde no país, que deixa a desejar. “Se a pessoa ficar doente e ela não puder contar com o serviço adequado, com tudo o que é necessário para ela melhorar, não vai resolver o seu problema”, analisa.

No mês passado, o Idec e outras 14 organizações divulgaram um manifesto denunciando o risco de aprovação a toque de caixa de uma nova lei sobre planos de saúde.

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